A pupila dilata vidrada no colorido dos minaretes, no formato das cúpulas que torcem o pescoço, na arquitetura dos bazares, na diversidade de formas dos jardins, no mistério dos corpos das mulheres encobertas num país de maioria muçulmana. O ouvido, sem entender bem o som magnético e potente, logo se avizinha de um dos inúmeros alto-falantes espalhados pela quinta maior urbes do mundo, no alto das torres que convocam os fiéis ao encontro com o Islã. Alá, Alaaaaaaaaaá, Alaaaaaaaaaá, repetem cinco vezes ao dia, marcando o compasso do tempo para os 13 milhões que trafegam por ali. O olfato não dá conta de tantos cheiros de especiarias saídos de bazares e de carrinhos de comidas preparadas por comerciantes no meio da rua. As mãos tocam o Ocidente, mas o olhar está na Oriente, do outro lado do estreito de Bósforo, numa cidade que está em dois continentes. Aos olhos de um forasteiro, parece muito européia para estar na Ásia e pouco ocidental para fazer parte da Europa. Ali come-se deliciosamente em qualquer parte, mas é no Oriente, para onde se pode cruzar de carro, de trem, de barco desde o lado mais moderno, onde o paladar é mais aguçado. É um curto-circuito sensorial e de entendimento.
Foi Constantinopla, capital avançada do império romano. Em 2016, reencontrou-se com a barbárie. Na segunda, em encontro marcado, definiu por seu Supremo que o sexo entre homossexuais é antinatural. “O comportamento sexual natural dos seres humanos é a relação sexual de um homem com uma mulher por meio da união de seus órgãos sexuais”, assinalou o veredito. Terça-feira, viu o Estado Islâmico, o contrário da civilização, sem marcar hora e local, chacoalhar a região de Sultanahmet, coração turístico da cidade, matando ao menos dez pessoas.
Por qualquer um dos tristes fatos, é difícil acreditar que Istambul sediou o início da Era Moderna, em 1453, quando um sultão resolveu fincar ali uma mesquita e se expandir pelo mundo. 2016 desafia o tempo na cidade mais importante da Turquia.
ps.: texto publicado em 13/5/2016
